Um atleta do interior gaúcho entrou na Justiça do Trabalho alegando que pagou para jogar por três meses na Associação Garibaldi de Esportes (AGE), clube que disputou a Terceirona no primeiro semestre e que agora joga a Copa Serrana.
O lateral Sidnei de Oliveira Gomes, 24 anos, processa o clube pelos salários que jamais recebeu, além de tentar reaver os R$ 1,5 mil que precisou pagar para ser inscrito como profissional na Federação Gaúcha de Futebol. Outros R$ 600 seriam para custear a moradia e as refeições na concentração do Estádio Alcides Santarosa.
Sidnei tem recibos de parte dos pagamentos. A primeira audiência ocorre na quinta-feira. Questionado por Zero Hora, o gerente de futebol da AGE, Rogério Loss, confirmou que a prática não se deu apenas com Sidnei. Ocorre com praticamente todos os atletas que defendem o time da cidade serrana:
Gerente de futebol admite: "Só jogamos com a ajuda mensal"
— Cobramos porque não temos condições de manter o clube. A gente não promete nada aqui além do direito de se projetar. São cinco ou seis que recebem, os mais velhos. Os demais são da base e têm oportunidade de jogar. Não ganham salário e nos ajudam financeiramente, pela oportunidade.
Sidnei é filho de um barbeiro e de uma diarista, cuja renda mensal raramente ultrapassa os R$ 3 mil. A família buscou um empréstimo de R$ 1 mil para tentar realizar o sonho de jogador. O lateral-direito assinou por R$ 800, R$ 200 abaixo do piso da categoria. E nunca foi pago. Além disso, precisou pagar a hospedagem, a alimentação e mais taxas de inscrição na federação.
— O Rogério Loss disse que, para eu ser inscrito, precisaria bancar as taxas. Fiquei surpreso. Além disso, ele falou que, para morar na concentração, custaria R$ 600 por mês. Não entendi, mas queria ser jogador de futebol, queria ser um profissional, viver disso. Então, aceitei — diz Sidnei.
No processo, o advogado do Sindicato dos Atletas Profissionais do Rio Grande do Sul, Décio Neuhaus, pede o pagamentos dos salários, as devoluções das taxas pagas pelo jogador, as mensalidades cobradas pela permanência em Garibaldi, além de um valor a título de dano moral. No total, a ação chega a R$ 27,4 mil.
— Havia relatos desta prática, mas, agora, tivemos a comprovação material deste pedágio, com a emissão de recibos — relata Décio. — É quase mais grave que trabalho escravo, pois, neste caso, o jogador está pagando para trabalhar — acrescenta o advogado.
A CLT, em seu artigo 458, permite que o empregador cobre um valor do funcionário no caso de fornecimento habitual de habitação e de alimentação, mas o índice não pode superar 25% do salário pago ao atleta.
No caso do Garibaldi, o agravante seria de que o clube não pagava nem salário. Conforme a legislação, cabe ao clube arcar com as taxas de inscrição, de amador ou profissional, uma vez que se beneficiará do trabalho do jogador.
— A AGE cobra dos jogadores, não os paga e ainda pode vendê-los. Não é normal os clubes cobrarem para profissionalizá-los. O contrato interessa ao clube — entende Décio Neuhaus.
A família Gomes decidiu procurar o presidente do Sindicato dos Jogadores Profissionais do Rio Grande do Sul, Paulo Beneduzi Mocelin, depois que o lateral-direito fechou 90 dias na AGE e foi chamado para renovar o contrato, pagando uma vez mais a taxa de R$ 600 para permanecer no clube.
Paulo e Suzete, pais de Sidnei, contam que receberam um aviso de Loss: caso o lateral não renovasse, perderia a vez, pois já estaria chegando uma nova leva de jogadores baianos e paulistas.
— Não ingressamos com o processo por causa do dinheiro. Até já conseguimos pagar o empréstimo, mas chega uma hora que a gente cansa de ser passado para trás o tempo todo — justifica Paulo Gomes, pai de Sidnei.
Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/